sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Capítulo 21 - Resgate


À medida que me escondo, penetrando a floresta, me perco na escuridão. É quase impossível enxergar um palmo à minha frente, mas continuo a me esconder, tateando os galhos das árvores contra os quais me colido repetidas vezes, começando a me ferir.

A única iluminação provém do céu, no entanto a copa das árvores a impede de chegar até mim, e prossigo no meu caminho incerto. O que eu estou fazendo aqui? Eu me pergunto começando a chorar quando o desespero se torna minha única companhia e certeza. Abraçando-me contra o frio, tropeço nas pedras e nas raízes das árvores, indagando como nenhum guarda ainda me ouviu.

Está difícil até mesmo me encontrar nessa floresta. Meus pés continuam involuntariamente seu caminho para lugar nenhum, me fazendo perder o equilíbrio a cada mínima irregularidade do solo, me restando apenas lamentar minha triste condição, enquanto o ar começa a me faltar. Mesmo que eu ao menos soubesse onde estou e minha distância para a mansão, sei que seria impossível invadi-la com todos os guardas armados. Acho que finalmente enlouqueci. Essa idéia me conforta, uma vez que pelo menos minha insanidade amenizará o vazio da minha morte, a qual parece cada vez mais próxima, com as mais variadas possibilidades. Um abismo ou um animal selvagem no meio da floresta, algum guarda, o cansaço que começa a invadir meu corpo ou até mesmo fome.

Percebo que não conseguirei salvar Dan, se é que ele ainda está vivo, e que nunca houve a mínima possibilidade de isso acontecer. Ele morrerá em vão, tendo se sacrificado por algum motivo desconhecido para me salvar. E agora eu me entrego à morte sem titubear. Os meus mesmos erros se repetem, minhas idéias e intenções distorcidas de fazer o certo e tentar ajudar sempre me levando a sacrificar a felicidade e a vida de outras pessoas.

Mas eu não posso morrer. Não agora. Não quando meus erros precisam ser consertados, antes que seja tarde demais. Eu sei que Dan nem ao menos gosta de mim. Entretanto, talvez seja o meu amor disfarçado de orgulho, mas provarei a ele que não sou uma criança mimada. E poderei seguir minha vida em paz, sem dever nada a ninguém.

Talvez Dan pense que o beijei por gratidão, provando que não me conhece de verdade. Eu jamais me entregaria a ele, apenas por ter salvado minha vida. E agora se um milagre acontecer, poderei provar isso. Meu anseio repentino me impulsiona a acelerar meus passos, ignorando a fadiga da caminhada, no entanto tropeço novamente numa das raízes, caindo ao chão, ralando meus jeans e minhas mãos, e vejo minha esperança se esvanecer conforme minhas lágrimas banham meu rosto em desolação.

Contudo, antes que eu me entregue à inércia que me parece a melhor opção, o som de um carro passando apressado na direção da casa me indica sua direção, que já me parecia impossível encontrar. Corro apressada me debatendo com os galhos que me ferem, os quais ignoro, para não me perder novamente.

A clareira se abre subitamente à minha frente, e eu me surpreendo com a sensação de alívio que me invade, embora eu saiba que a pior parte nem ao menos começara. Protegendo-me atrás das árvores, onde a iluminação não me alcança, deixando-me invisível aos guardas, reconheço a área.

A cena é semelhante a que eu vira pela manhã, os mesmos carros estacionados, entre os quais identifico o de Dan apenas por seu casaco de couro escuro cobrindo o banco do motorista, me mostrando que ele ainda não fora embora, e os guardas vigiando a entrada. A van, que me alertara com seu som ao passar próximo à floresta, estaciona na frente da casa, e o motorista após conversar com um dos guardas, abre a porta lateral. Eu me encolho contra um dos troncos mais próximos tentando enxergar qual possível encomenda estão recebendo. Estremeço ao imaginar que já descobriram que Dan mentira, e o técnico que Silas contratara já traz o cofre com seu conteúdo.

No entanto, me surpreendo ao ver mulheres saindo do carro. Minha dúvida persiste apenas por poucos segundos, até que enxergo em suas saias curtas e blusas decotadas o milagre que eu pedira. Eu preciso me juntar a elas, e não será tão difícil uma vez que são muitas. No entanto, o meu aspecto não é dos mais atraentes, uma vez que estou vestindo uma calça jeans suja e rasgada, uma camiseta folgada e meu rosto ferido, assim como meu cabelo, deve estar sujo.

Contudo, percebo que não haverá outra oportunidade. Ainda mais que os guardas estarão entretidos. Então, solto meus cabelos, penteando-os com os dedos, desejando que sejam obedientes como os de Dan. Amarro minha camiseta logo abaixo dos seios e espero que alguém acredite que minha calça esteja num sujo moderno.

Com minha esperança renovada, corro até elas tentando não chamar atenção, e felizmente mal percebem minha presença. Entretanto, sinto meu coração apertado em meu peito quando uma delas me encara preocupada. Sorrio embaraçada e consigo sua simpatia. Ela sorri de volta e sussurra para mim, enquanto passa um batom vermelho nos meus lábios:

__Amiga, você deve ter tido uma noite horrível. Deve estar precisando de dinheiro para ainda ter aceitado vir para cá. Mas eu nunca te vi aqui, antes.

__Eu sou nova... __Gaguejo olhando-me no pequeno espelho que ela me oferece, juntamente com o pó compacto que espalho no rosto, assustando-me com o aspecto estranho do meu rosto com tanta maquiagem. O meu cabelo não está tão mal, e mal tenho tempo de recusar quando ela com uma técnica surpreendente rasga as duas pernas da minha calça na altura das minhas coxas.

__Bem melhor. O dinheiro é ótimo. Eles pagam super bem pelo nosso silêncio. Eu já vi cada coisa estranha aqui, mas permaneço calada. Faça o mesmo. Preparada? __Pergunta, quando um dos guardas nos sinaliza alguma coisa antes de abrir as portas.

__Preparada? __Questiono a mim mesma, sendo empurrada pelo movimento de mulheres que gritam “Surpresa!” ao entrarem na sala repleta de homens.

Parece que elas são conhecidas, ou talvez façam tudo com muita naturalidade, uma vez que assim que entramos na sala, cada uma já está no colo de um dos homens, sendo recebidas calorosamente. A sala parece ocupada pelas mesmas pessoas da manhã, exceto que agora está iluminada à meia-luz, e o maior entretenimento são as mulheres. Permaneço parada próxima a porta pedindo que ninguém repare em mim, tentando encontrar uma forma de subir as escadas sem ser interceptada, no entanto, enquanto observo a estranha cena que se desenrola a minha frente, vejo a mulher que me ajudara antes me indicar a um rapaz.

Ele parece tímido ao se aproximar de mim, e o reconheço como o homem que estremecera ao introduzir Dan no escritório de Silas. Eu tento desviar meu olhar, e ele faz o mesmo, porém continua o seu percurso até mim cautelosamente.

__Oi, eu sou o Diego.

__Oi, Diego. __Balbucio insegura ao ver seu olhar percorrer meu corpo como se fosse uma mercadoria em exposição. Mas na verdade, eu sou. Ele não parece querer saber meu nome, no entanto tento manter uma conversa, amedrontada com a possibilidade de alguém me reconhecer. __Letícia. Tudo bem?

__Tudo. __Ele dá um sorriso tímido, tendo dificuldade em encarar meus olhos. Eu agradeço por ele ser tímido, uma vez que não pretendo imitar os casais ao nosso redor. Porém antes que eu respire aliviada, o sinto me beijando com voracidade, deixando-me atônita. Ele percebe que não participo do beijo e me encara curioso. __O que houve, gata?

__É o meu primeiro dia aqui. Será que nós não podemos subir?

__Você é tímida? __Pergunta incrédulo, quase chateado, deixando-me ofendida.

__Não...é...que... __Tento lhe dar um sorriso sedutor, e surpreendentemente funciona, uma vez que ele parece desconsertado.

__É que não podemos subir.

__O seu chefe está lá?! __Exclamo sem conseguir conter minha ansiedade.

__Não! __Diz surpreso, acariciando meus cabelos e meu pescoço. __Saiu mais cedo, bastante irritado. Nós nunca poderíamos fazer isso se ele estivesse aqui. É porque hoje o clima foi pesado, temos que nos divertir um pouco. Aliviar o estresse. __Sorri olhando-me maliciosamente fazendo meu corpo se contrair em repulsa.

__É porque eu gosto de privacidade... Faço o que você quiser. __Ofereço enojando a mim mesma, enquanto brinco com meus dedos em seu peito. Dentre todos os meus adjetivos desprezíveis ainda faltava esse. O que eu estou fazendo aqui? Pergunto-me pela milésima vez, controlando minhas náuseas ao ver seu olhar percorrer meu corpo novamente com lascívia, enquanto suas mãos me puxam para mais perto.

__Não faz isso comigo. A gente pode ir para o meu quarto ali atrás...__Sussurra, segurando firme meu corpo contra o seu.

__Mas a vista lá em cima deve ser linda... __Suspiro à sua orelha, beijando-a, numa tentativa impensada de continuar meu plano.

__Tudo bem. __Sorri persuadido num tom de voz ansioso. __Acho que todo mundo está muito ocupado para prestar atenção na gente. __Conclui me abraçando e me encaminhando à escada, e é assim que eu me vejo novamente no meio do furacão do qual eu já havia conseguido escapar. Mas aparentemente eu ainda não aprendera a lição.

__Tem algum quarto aqui? __Indago ao chegarmos ao corredor melhor iluminado.

__Aqui ficam os escritórios...

__Que tal esse? __Sugiro puxando-o para a porta que dava à sala de Silas, tentando agir com naturalidade, o que é difícil com suas mãos explorando meu corpo.

__Não! __Exclama puxando-me de volta energicamente. __Está ocupado.

__Por quem?__Pergunto procurando disfarçar minha ansiedade.

__São uns colegas meus.

__Talvez eles queiram companhia. __Proponho, dando outro dos meus sorrisos que o faz hesitar.

__Você está só comigo. Vamos logo com isso. __Declara irritado, me fazendo estremecer.

__Mas podia ser legal... __Meu Deus! Minha consciência grita para que eu dê ouvidos a ela, contudo, agora que estou no tabuleiro, tenho que jogar o meu jogo. E então bato na porta.

__O que houve? __Ouço uma voz masculina, a qual reconheço como pertencente a Orlando, perguntar.

__As garotas chegaram. __Diego fala relutante, dando-me um olhar de reprovação. __Tem uma linda aqui comigo querendo brincar com vocês também.

__Diego, a gente está ocupado. E por que foram chamar logo hoje que nós não podemos?

__Foi o Pierre.

__Que saco. A gente ainda não acabou aqui. __Lamenta fazendo meu coração transbordar de felicidade, enquanto contenho minhas lágrimas de felicidade. Dan está vivo! Ele está vivo! Minha consciência tenta sem sucesso reprimir meu coração em êxtase, dizendo que Dan não merece nada do que estou passando por ele, no entanto não consigo ouvi-la.

Mas logo minha alegria acaba quando Diego volta a me beijar. Eu busco fugir dos seus braços, empurrando-o, e pedindo que pare, entretanto ele começa a parecer hostil, pressionando dolorosamente meu corpo contra a parede, sem se importar com minha relutância. Eu me esforço sem sucesso em afastar suas mãos que exploram meu corpo, tentando tirar minhas roupas. No entanto, percebo que minha mínima força não se compara à sua avidez em me atacar.

Procurando alguma coisa que possa me salvar, estico meu braço com dificuldade numa frágil tentativa de alcançar uma das esculturas que repousam sobre o console no corredor. Ele percebe minha intenção, não parecendo entendê-la, até que encontro um brilho violento em seus olhos, quando sua mão se dirige ao cós de sua calça. Mas antes que ele possa pegar sua arma, consigo levantar uma das pesadas estátuas, golpeando-a com toda minha força contra sua cabeça.

            Diego tomba ao chão no mesmo momento, porém o tapete abafa o som de sua queda. Sem nem ao menos tomar consciência do que eu fizera, o revisto, encontrando a arma que ele procurara em sua calça, e verificando a presença de balas, como já vira Dan fazer, a trago junto comigo.

            Desvio da poça de sangue que se forma ao redor de sua cabeça como um halo mortal. Eu o matei! Exclamo em pensamento, enojada comigo mesma. Nada mais me separa de Dan, sou uma assassina igual a ele. Entretanto, cada segundo é essencial, e antes que eu possa chorar assustada, segurando a arma atrás do meu corpo, bato à porta do escritório de Silas, sem ter tempo de me punir por um ato tão hediondo.

            __Garotos... __Falo tentando disfarçar minha voz entrecortada pelo desespero. __Tem alguém aí querendo se divertir? __Encostando minha orelha à porta, ouço os três homens debaterem entre si, até que um deles, que reconheço como Caio decide aceitar minha proposta, dizendo que os dois conseguirão controlar Dan.

            Ele surge sorridente à porta, permitindo-me apenas ver uma cadeira no centro da sala, na qual parece haver alguém amarrado, antes de fechá-la novamente. Nem ao menos olha para o meu rosto, embora eu não saiba se ele me reconheceria, apenas olhando para minhas pernas.

            Quando seu olhar antes distraído encontra o corpo de Diego possivelmente morto no chão, percebo seu horror, que só aumenta ao me ver apontar a arma para ele. Entretanto, volta a sorrir, tentando sem sucesso me tomar a arma.

            __Isso é uma brincadeira, gatinha? O que você está fazendo com esse brinquedo?

            __Estou brincando, como você gosta de fazer. __Sussurro tentando não chamar a atenção dos outros guardas ainda com Dan na sala. __É melhor você se ajoelhar antes que fique pior para você.

            __Garota, o que você está fazendo? __Pergunta entre apreensivo e enraivecido. __É melhor você me dar isso.

            __Ajoelhe-se. __Ordeno afastando a arma da altura de suas mãos. Caio obedece ainda sorrindo. __Vire-se. __Ele já não parece tão confiante quando de costas para mim. Eu o vejo procurar as melhores palavras para me acalmar, mas antes que possa escolhê-las, com toda minha força, bato a coronha contra sua nuca, fazendo-o cair inerte ao chão. Reprimindo a alegria súbita que me invade por ver Marcelo vingado, recolho sua arma, com minhas mãos trêmulas, úmidas pelo medo que ainda não atingira minha mente.

            Batendo à porta novamente, em silêncio, os espero abrirem imaginando que seja Caio. Eles sorriem comentando o quanto fora rápido. Porém o sorriso de Orlando já não parece tão alegre ao me ver apontar duas armas para ele.

            __Entre e não chame atenção. __Determino ao entrar na sala, apontando uma arma para cada um, e fechando a porta atrás de mim. O outro homem também parece assustado, no entanto meu olhar se fixa em apenas um ponto da sala. A poltrona logo abaixo do lustre na qual jaz Dan. Eu o reconheço pelos cabelos que caem sobre seu rosto e pelas tatuagens à mostra no braço machucado.

            Eu o vejo levantar seu rosto para encarar o meu, sem nem ao menos admirar minhas roupas curtas como todos haviam feito até então. Ele não parece me reconhecer inicialmente, contudo quando encontro seu olhar irritado percebo que já sabe. Seu rosto está machucado, com alguns cortes nos lábios e nos supercílios, a partir dos quais correm filetes de sangue. Seus braços e pernas amarrados fortemente pelas cordas aos braços e pernas da cadeira também parecem feridos, e sua posição mantendo o abdome contraído me indica que ele também fora atingido pelos golpes.

            __Era você hoje. A tal Manuela. __Ouço um dos homens dizer surpreso.

            __A própria. Soltem-no.

            __Garota, você está se metendo onde não deve. O Silas libertou você. E duvido que você saiba usar isso. __Sorri Orlando, procurando parecer compreensivo.

            __O Caio também duvidou. E ele não está aqui, está? __Pergunto irritada, tentando parecer segura, embora seja quase impossível controlar meus tremores, e as armas em minhas mãos começam a pesar insuportavelmente.

            __O que você quer? __O outro homem pergunta, começando a sorrir, apesar de eu ver seus olhos alertas avaliando o quanto de perigo eu represento para eles.

            __Ele. __Indico Dan com a cabeça, o qual continua a me encarar entre aborrecido e incrédulo. Eu desvio meu olhar para os homens e continuo. __Desamarrem as cordas.

            __Garota, você viu o tanto de gente que tem ali embaixo? Você vai morrer. E para quê salvá-lo? Você já veio disfarçada, saia assim. Vá embora. Para quê se importar com ele? Ele não pensou em você quando matou seus pais. __Argumenta Orlando, buscando sem êxito me dissuadir.

            __Isso é problema meu. Comecem logo.

            __Você vai mesmo atirar na gente? Ótimo, todo mundo vai ouvir e subir. __O outro homem diz sorrindo, parecendo mais confiante.

            __Todo mundo, menos você. Pois já estará morto.

            Então os vejo apontarem suas armas contra mim, e não entendo como eles puderam pegá-las tão rápido, fazendo meus tremores apenas aumentarem, quando o medo me paralisa qualquer ação voluntária.

            __Agora você também não vai ouvir.

            Mortificada por toda minha investida ter se transformado numa piada, procuro o olhar de Dan ainda fixo no meu, como num pedido de desculpas, no entanto me surpreendo ao percebê-lo pretendendo me dar orientações. A direção do seu olhar me parece incerta, muito mais o seu objetivo. Entretanto cegamente eu o obedeço, atirando contra o lustre, quando Dan se joga com sua poltrona para longe. O lustre cai sobre um dos homens, o qual desaba com seu peso, deixando a sala na escuridão.

            Assim que um dos homens acende uma lanterna eu percebo a sombra de Dan ainda caído no chão, começando a se desvencilhar das cordas, cortando-as com algum fragmento do lustre. O barulho da confusão fora ensurdecedor, e imagino que todos os homens lá embaixo já tenham percebido a movimentação e se dirijam para cá. Jogo uma das armas, deixando-a escorregar pelo chão até Dan, sabendo que assim ela será mais útil. Mantendo-me escondida com a outra.

            A sala é preenchida por um silêncio aterrador, e é impossível enxergar qualquer coisa, uma vez que com a noite escura e o céu fechado, nem mesmo a luz da lua entra pelo vidro da janela. Imagino que o homem que fora atingido pelo lustre ainda esteja no chão, e desconfio de que ele possa estar morto, aumentando meu número de vítimas.

Reconheço Orlando apenas pela luz de sua lanterna, a qual ligara novamente, percorrendo a sala procurando Dan, que sumira de seu campo de visão, supondo com razão que ele seja um perigo muito maior que eu. Eu a vejo iluminar os móveis e as paredes da sala, os restos do lustre sobre o corpo do homem ainda caído no chão, por fim encontrando Dan o qual termina de se libertar das amarras. Junto com a luz da lanterna, percebo um minúsculo ponto luminoso vermelho dançante no peito de Dan. E antes que eu possa pensar em qualquer coisa, mal suportando o impulso da arma contra mim, atiro contra a direção de onde a luz parece se originar, até que a lanterna cai ao chão, e percebo que ela está atrelada à arma.

            Dan me abraça contra seu corpo, embora eu mal consiga enxergá-lo, e me conduz até a janela, atirando contra o vidro que se espatifa em mil pedaços deixando-nos uma saída impossível. Dan continua a me carregar quase que contra a minha vontade, ordenando que eu pule.

            __É impossível. __Sussurro trêmula por sua proximidade e por tudo que acontecera desde aquele beijo perturbador. __Eu vou quebrar uma perna, no mínimo.

            __Confie em mim. __Escuto sua voz e encontro seu rosto ferido, mas seguro, iluminado pela fraca luz da noite que entra pela janela. E de alguma forma, eu percebo que confio. __Você tem que se impulsionar para cair no meio da piscina. Mantenha seu corpo flexionado, para não absorver o impacto de uma vez.

            __Eu não vou conseguir. __Lamento observando assustada a piscina que parece tão distante, há quase quatro metros abaixo. Na melhor das hipóteses, eu colidirei com a minha cabeça e morrerei instantaneamente. Numa das piores, ficarei tetraplégica para sempre.

            __É claro que você consegue. Já conseguiu coisas muito mais impossíveis. __Confessa encarando meu rosto, com o que parece ser admiração, e quase orgulho.

            E assim que ouço começarem as batidas violentas contra a porta, eu salto no ar, sendo recebida pelo vento cortante. É como voar. Abraço minhas pernas contra meu corpo, como Dan ensinara e logo sinto o impacto violento da água gélida. Meus pés ainda tocam o chão da piscina, e percebo que teria fraturado uma das pernas, se não as tivesse abraçado.

            Ainda tossindo a água que engolira na queda chego à superfície e antes que perceba onde está a margem mais próxima, sinto Dan começar a me puxar pela água, quando os primeiros tiros são disparados contra ela.

            Meu corpo está encharcado e é bom que eu esteja com tão poucas roupas, uma vez que não seria fácil correr tão rápido com jeans molhados. Dan me leva até a van, ainda estacionada na frente da casa, abrindo sua porta, revelando o motorista que parece ocupado com uma das mulheres.

            O motorista nem ao menos se dá conta do que está acontecendo, ao sair correndo apavorado com sua companheira, após entregar a chave do carro a Dan, quando ele lhe aponta sua arma. Pela própria porta do motorista, Dan me empurra para o banco do passageiro, logo nos colocando em movimento, alcançando a estrada de terra.

            Olhando assustada para a entrada da casa, enquanto começamos a deixar a clareira, vejo vários dos homens correrem apressados, pegando seus carros, os quais começam a nos perseguir quando penetramos a floresta.

            Dan me oferece a direção do carro, me pedindo para adentrar ao máximo a mata fechada por caminhos diferentes do qual eu vira ser usado, quando aparecendo por fora da janela, começa a atirar contra nossos perseguidores. Eu lhe entrego a minha arma, sem saber como ela permanecera comigo após toda essa loucura, e me concentro no terreno à minha frente, o qual parece tudo, menos uma estrada. Qualquer espaço entre duas árvores que permita a passagem da van se torna uma trilha para mim, enquanto Dan, parecendo conhecer a área, me dá orientações.

            Mais uma vez a cena se repete, embora dessa vez o carro não seja blindado, com a parte traseira da van começando a se danificar com os tiros. Mesmo assim, eu me pergunto quantas vezes essa cena ainda vai se reproduzir. E me surpreendo com a minha própria resposta, dizendo que não me importa, e que de alguma maneira doentia eu estou quase feliz.

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